A Criação, Versículos 1 e 2 - Comentário de Matthew Henry / Gênesis

Gênesis 1 -  Versículos 1 e 2   A Criação

Comentário de Matthew Henry Gênesis 1 -  Versículos 1 e 2


A Criação


Nestes versículos temos a obra da criação em seu epítome e em seu embrião.

I. Em seu epítome, v. 1, onde encontramos, para o nosso conforto, o primeiro artigo do nosso credo, que Deus Pai, o Todo-poderoso, é o Criador do céu e da terra, e cremos nele como tal.

1. Observe, neste versículo, quatro coisas:

(1) O efeito que produziu o céu e a terra, isto é, o mundo, incluindo toda a estrutura e os elementos do universo, o mundo e todas as coisas a esse respeito, Atos 17.24. O mundo é uma grande casa, consistindo de histórias superiores e inferiores, a estrutura imponente e magnífica, uniforme e conveniente, e cada cômodo é bem mobiliado, com toda a sabedoria. Esta é a parte visível da criação que Moisés aqui procura explicar. Portanto, ele não menciona a criação dos anjos. Mas como a terra não só possui a sua superfície enfeitada com ervas e flores, mas também as suas entranhas são enriquecidas com metais e pedras preciosas (que participam de sua natureza sólida e mais valiosa, embora a criação delas não seja mencionada aqui), assim os céus não só são embelezados aos nossos olhos com luminares gloriosos que enfeitam o seu exterior, de cuja criação lemos aqui, mas por dentro estão repletos de seres gloriosos, fora da nossa vista. Estes são seres celestiais que superam em excelência os astros, assim como o ouro ou as safiras excedem os lírios do campo. 
No mundo visível é fácil observar:

[1] Grande variedade, diversos tipos de seres imensamente diferentes uns dos outros em
sua natureza e constituição. Senhor, quão múltiplas são as tuas obras, e todas são muito boas! [2] Grande beleza. O céu azul e a terra verdejante são charmosos ao olhar de espectadores curiosos. Quanto mais os ornamentos de ambos. Quão transcendente então deve ser a beleza do Criador! [3] Grande exatidão e precisão. Para aqueles que, com a ajuda de microscópios, olham estritamente para as obras da natureza, elas parecem muito mais refinadas do que qualquer obra de arte. [4] Grande poder. Este não é um monte de matéria morta e inativa, mas há virtude, em diferentes níveis, em cada criatura. A terra em si possui uma força magnética.  [5] Grande ordem, uma dependência mútua de seres, uma harmonia exata de movimentos, e uma admirável cadeia e conexão de causas. [6] Grande mistério. Há fenômenos na natureza que não podem ser resolvidos, segredos que não podem ser compreendidos nem explicados. Mas a partir do que vemos do céu e da terra podemos facilmente deduzir o poder eterno e a divindade do grande Criador, e podemos nos suprir com motivos abundantes para os seus louvores. E que a nossa condição e posição, como homens, nos faça lembrar da nossa obrigação como cristãos, que é sempre manter o céu em nossa vista e a terra debaixo de nossos pés.

(2) O autor e a causa desta grande obra: DEUS. A palavra hebraica é Elohim, o que indica:     [1] O poder de Deus, o Criador. El significa o Deus forte. E o que, menos do que uma força poderosa, poderia fazer surgir todas as coisas do nada? [2] A pluralidade das pessoas da Divindade, Pai, Filho e Espírito Santo. Este nome plural de Deus, em hebraico, que fala dele no plural, embora ele seja um, talvez fosse para os gentios um sabor de morte para a morte, endurecendo-os em sua idolatria. Mas isto é para nós um sabor de vida para vida, confirmando a nossa fé na doutrina da Trindade, a qual, embora seja apenas secretamente sugerida no Antigo Testamento, é claramente revelada no Novo Testamento. O Filho de Deus, a eterna Palavra e Sabedoria de Deus estavam com Ele quando fez o mundo (Pv 8.30). Freqüentemente ouvimos que o mundo foi feito por Ele, e sem Ele nada do que foi feito se fez, João 1.3,10; Efésios 3.9; Colossenses 1.16; Hebreus 1.2. Oh, que pensamentos elevados isto deve formar em nossas mentes a respeito deste grande Deus, de quem nos aproximamos em adoração religiosa, e deste grande Mediador em cujo nome chegamos mais perto!

(3) O modo pelo qual esta obra foi realizada: Deus criou, isto é, fez do nada. Não havia nenhuma matéria pré-existente a partir da qual o mundo foi produzido. Os peixes e as aves foram certamente produzidos a partir das águas, e os animais e o homem da terra. Mas esta terra e estas águas foram feitas do nada. Pelo poder comum da natureza, é impossível que algo seja feito do nada. Nenhum artífice pode trabalhar, a menos que ele tenha com que trabalhar. Mas pelo poder infinito de Deus, não só é possível que algo seja feito do nada (o Deus da natureza não está sujeito às leis da natureza), mas na criação é impossível que ocorra o contrário, porque nada é mais desrespeitoso para a honra da Mente Eterna do que duvidar de sua onipotência. Assim, a excelência do poder pertence a Deus, como também toda a honra e toda a glória.

(4) Quando esta obra foi produzida: No princípio, isto é, no início do tempo, quando este relógio foi colocado para funcionar pela primeira vez. O tempo começou com a produção destes seres que são medidos pelo tempo. Antes do início do tempo não havia nada além daquele Ser Infinito que habita a eternidade. Se perguntássemos por que Deus não fez o mundo antes, apenas escureceríamos o conselho com palavras sem conhecimento. Pois como poderia haver cedo ou tarde na eternidade? E ele o fez no início do tempo, de acordo com os seus conselhos eternos antes de todo o tempo. Os rabinos judeus têm um ditado que diz que houve sete coisas que Deus criou antes do mundo, que têm apenas o propósito de expressar a excelência delas: A lei, o arrependimento, o paraíso, o inferno, o trono da glória, a casa do santuário, e o nome do Messias. Mas para nós, é suficiente dizer: No princípio era o Verbo, João 1.1.

2. Aprendamos com isso:

(1) Que o ateísmo é loucura, e os ateus são os maiores loucos na natureza. Porque eles
vêem que há um mundo que não poderia se fazer sozinho, e, no entanto, não reconhecem que há um Deus que o fez. Sem dúvida alguma, eles não têm desculpa, mas o deus deste mundo cegou as suas mentes.

(2) Que Deus é o Senhor soberano de todos por um direito incontestável. Se Ele é o Criador, sem dúvida Ele é o dono, o proprietário dos céus e da terra.

(3) Que com Deus todas as coisas são possíveis. Portanto, feliz é o povo que o tem por seu Deus, e cuja ajuda e esperança esperam de Seu nome, Salmos 121.2; 124.8.

(4) Que o Deus a quem servimos é digno de glória e louvor, e é exaltado acima de tudo e de todos, Neemias 9.5,6. Se Ele fez o mundo, não precisa dos nossos serviços, nem pode ser beneficiado por eles (At 17.24,25). Mesmo assim Ele os requer, e merece o nosso louvor, Apocalipse 4.11. Se todas as coisas são dele, tudo deve ser para Ele.

II. Aqui está a obra da criação em seu embrião, v. 2, onde temos um relato da primeira matéria e do primeiro movimento.

1. Um caos foi a primeira matéria. Ela é aqui chamada de terra (embora a terra propriamente dita não tenha sido feita até o terceiro dia, v. 10), porque ela se parecia muito com o que depois foi chamado de terra, mera terra, destituída de seus ornamentos, e era como uma massa pesada e desordenada. Também é chamado de o abismo, tanto por sua vastidão como porque as águas, que foram depois separadas da terra, estavam agora misturadas com ela. A partir desta imensa massa de matéria, todos os corpos e até mesmo o firmamento e os céus risíveis, foram depois produzidos pelo poder da Palavra Eterna. O Criador poderia ter feito a sua obra perfeita a princípio, mas por este processo gradual Ele pode mostrar qual é, ordenadamente, o método de sua providência e de sua graça. Observe a descrição deste caos.

(1) Não havia nele nada desejável de ser visto, porque era sem forma e vazio. Tohu e Bohu, confusão e vazio. Assim estas palavras são traduzidas, Isaías 34.11. Ela era sem forma, era inútil, não tinha habitantes, não tinha ornamentos, a sombra ou aridez severa das coisas por vir, e não a imagem das coisas, Hebreus 10.1. A terra é quase reduzida à mesma condição outra vez pelo pecado do homem, sob o qual a criação geme. Veja Jeremias 4.23: Observei a terra, e eis que estava assolada e vazia. Para aqueles que têm os seus corações no céu, este mundo inferior, em comparação com o superior, ainda parece ser nada além de confusão e vazio. Não há nenhuma beleza verdadeira para ser vista, nenhuma plenitude satisfatória para ser desfrutada, nesta terra, mas somente em Deus.

(2) Mesmo se houvesse qualquer coisa desejável para ser vista, não havia luz para vê-la. Porque as trevas, trevas espessas, estavam sobre a face do abismo. Deus não criou estas trevas (como é dito que Ele criou as trevas da aflição, Isaías 45.7), porque foi só a falta de luz, a qual não se poderia dizer que faltava até que algo fosse criado para ser visto através da luz. Nem se precisava reclamar da falta dela, pois não havia nada para ser visto além da confusão e do vazio. Se a obra da graça na alma é uma nova criação, este caos representa o estado de uma alma desgraçada e pecadora. Há desordem, confusão, e toda obra má. Está vazia de todas as coisas, por que não tem a Deus; é escura, é a própria escuridão. Esta é a nossa condição por natureza, até que a graça poderosa efetue uma mudança bendita.


2. O Espírito de Deus foi o primeiro a se mover: Ele se movia sobre a face das águas. Quando consideramos a terra sem forma e vazia, parece-me que ela é como o vale repleto de cadáveres e ossos secos. Eles podem viver? Esta massa confusa de matéria pode ser formada em um mundo belo? Sim, se um espírito de vida procedente de Deus entrar nele, Ezequiel 37.9. Agora há esperança a respeito disso. Porque o Espírito de Deus começa a operar, e, se ele opera, quem ou o que impedirá? E dito que Deus fez o mundo pelo seu Espírito, Salmos 33.6; Jó 26.13. E a nova criação é realizada pelo mesmo trabalhador poderoso. Ele se moveu sobre a face do abismo, como Elias se estendeu sobre a criança morta, assim como a galinha junta os seus pintinhos debaixo de suas asas, e paira sobre eles, para aquecê-los e alimentá-los, Mateus 23.37. Assim como a águia agita o seu ninho, e bate as asas sobre os seus filhotes (a mesma palavra que é usada aqui), Deuteronômio 32.11. Aprendemos, conseqüentemente, que Deus não só é o autor de todos os seres, mas a fonte de vida e de movimento. A matéria morta estaria para sempre morta, se Ele não a tivesse estimulado. E torna-se digno de crédito para nós que Deus ressuscitasse os mortos. Um poder que tirou este mundo da confusão, do vazio, e das trevas, no início do tempo, pode, no fim do tempo, tirar os nossos corpos maus da sepultura, embora ela seja uma terra de trevas como as próprias trevas, e sem qualquer ordem (Jó 10.22), e pode torná-los corpos gloriosos.

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